Ela estava em sua escrivaninha, concentrada. Escrevendo ou desenhando.
Ele não costuma se interessar muito com como ela passa o tempo, mas era uma cena incomum.
- O que estás fazendo, ojou?
- Desenhando. Escrevendo. Criando personagens.
- Algo grande em mente?
Ela para de mover o lápis. Aguarda uns segundos antes de responder.
- Não, nada grande. Quando você faz uma crônica, você ganha o mérito se as pessoas gostam, mas chovem críticas, normalmente negativas, se você não agrada.
Esse é um problema recorrente de qualquer pessoa que escreve um texto. Alguém não vai gostar do que você disse e manifestará o descontentamento enfaticamente.
- Mas se você faz um personagem comentar algo, a coisa muda um pouco. Se o que o personagem falou for bem recebido, você ganhará pontos, pois foi você quem inventou o que o personagem disse. Logo, você rouba os créditos do seu personagem.
Ele percebeu que estava comendo os biscoitos que ela tinha trazido para a escrivaninha no momento em que eles acabaram. Ela não se importou e continuou:
- E se você faz um personagem falar algo indigesto, o personagem vira um escudo. Não foi você quem desagradou, foi o personagem. Ele falou aquilo porque a personalidade dele o fez falar aquilo. E ainda terá quem o elogiará, porque fazer um personagem detestável é um grande e glorioso feito. Se expressar através de personagens tem maior tendência a render lucros - desde que as pessoas se lembrem de que os personagens são seus.
Ela voltou a mexer o lápis.
Fazia sentido. Ele nunca tinha ouvido ela falar algo que não fosse aprovado pelo público. Talvez com essa idéia ela pretendesse soltar algumas declarações diferentes.
A razão da existência dos personagens dela lhe parecia estranhamente familiar, mas preferiu não perder tempo pensando no assunto.
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